Johnny Shines: A Voz do Delta Que Nunca se Calou

Johnny Shines: A Voz do Delta Que Nunca se Calou


Foto: Doyle M. Pace


Nascido em 26 de abril de 1915 em Frayser, Tennessee, e falecido em 20 de abril de 1992, em Tuscaloosa, Alabama, Johnny Shines é um dos nomes mais reverenciados do blues acústico do Delta. Sua trajetória é marcada por encontros decisivos, uma fé inabalável na música e uma sonoridade que atravessou gerações com a força bruta da alma e da guitarra slide.


As Raízes do Delta


Criado em Memphis, Shines aprendeu a tocar guitarra ainda menino com sua mãe, desenvolvendo cedo uma paixão pela música. Na década de 1930, percorreu o Sul dos Estados Unidos tocando em bares, esquinas e plantações. Foi nesse cenário que a música se tornou não apenas arte, mas um modo de vida – muitas vezes duro, sempre autêntico.


O Encontro com Robert Johnson


Em 1935, tudo mudou. Johnny Shines conheceu Robert Johnson, o lendário bluesman que, com sua aura mística e técnica extraordinária, deixou uma marca profunda na vida de Shines. Eles viajaram juntos pelo Sul e até pelo Canadá, compartilhando , noites frias e a estrada poeirenta.

O assassinato de Johnson em 1938 foi um golpe duro. Shines, desiludido, afastou-se da música por um tempo. Mas a inspiração e a memória do amigo não o deixaram. A chama reacendeu, e foi graças a Robert Johnson que Johnny Shines retomou a carreira, determinado a preservar e expandir o legado do blues do Delta.


A Caminho de Chicago


Em 1941, três anos após a morte de Johnson, Shines mudou-se para Chicago, o novo epicentro do blues urbano. Entre 1946 e 1958, gravou esporadicamente, muitas vezes com brilho e intensidade, mas enfrentando dificuldades com selos e distribuição. Mesmo assim, suas gravações dessa época – cruas, intensas e emotivas – tornaram-se cultuadas com o passar do tempo.


Versatilidade e Renascimento


Com a redescoberta do blues nas décadas de 1960 e 1970, Johnny Shines voltou aos holofotes. Gravou álbuns que iam do acústico intimista ao blues elétrico de Chicago, tocando tanto sozinho quanto com bandas completas. Ele se tornou uma ponte viva entre o passado rural do Delta e o presente urbano do blues.



Destaque: Too Wet to Plow


Entre os muitos discos de Shines, "Too Wet to Plow" (1977) merece destaque especial. Gravado na Noruega, o álbum apresenta Johnny em forma inspirada, transitando entre o lamento profundo e a fúria do blues.


O disco traz faixas memoráveis como:


Travelling Back Home – Um retorno espiritual ao Delta, com lirismo e dor.

Moanin' the Blues – Uma aula de sentimento e expressão, digna de seus mestres.

Red Sun – Atmosférica e envolvente, mesclando tradição e modernidade.

The Wind Is Blowin' – Um blues climático, com sopros de melancolia e resistência.

Trouble's All I See – Crônica de uma vida marcada por perdas e superações.


O álbum ainda conta com participações especiais de Louisiana Red, outro mestre do blues de raiz, e do virtuoso gaitista Sugar Blue, conhecido por seu trabalho com os Rolling Stones. A química entre os músicos é palpável, elevando o disco a um dos grandes momentos da carreira de Shines.


Legado Imortal


Johnny Shines morreu pouco antes de completar 77 anos, mas sua voz continua ecoando. Seja nos sulcos de um disco de vinil ou em plataformas digitais, ele permanece como um dos pilares do blues acústico do Delta, fiel à herança de Robert Johnson, mas com brilho e personalidade próprios.

Seu legado é a prova de que o blues verdadeiro não morre – apenas se transforma e renasce a cada acorde sentido.


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