Monster Mike Welch – o blues vivo em cada nota

Monster Mike Welch – o blues vivo em cada nota



Há guitarristas que tocam com as mãos, e há aqueles que tocam com a alma. Monster Mike Welch pertence à segunda categoria — um músico que fez da dor, da persistência e da paixão uma linguagem universal. Com seu mais recente álbum, "Keep Livin' Til I Die", Welch reafirma o blues como um território de resistência e beleza, onde cada acorde carrega a lembrança de quem sobreviveu ao tempo e às próprias sombras.

O garoto prodígio de Boston

Michael Welch nasceu em Boston, Massachusetts, em 11 de junho de 1979. Desde pequeno, mergulhou no universo do blues ao lado do pai, ouvindo discos de B.B. King, Albert King, Magic Sam e Otis Rush. Com apenas oito anos, já tocava guitarra; aos onze, impressionava plateias locais; e aos treze, ganhou o apelido que o acompanharia para sempre — “Monster Mike”, dado por Dan Aykroyd, o eterno Blues Brother, após vê-lo tocar como um veterano em corpo de criança.

Seu talento precoce o lançou à cena profissional ainda na adolescência. Nos anos 1990, Mike gravou três álbuns solo que o apresentaram ao mundo: These Blues Are Mine (1996), Axe to Grind (1997) e Catch Me (1998). Era o início de uma trajetória marcada pela busca de autenticidade, em um equilíbrio raro entre virtuosismo técnico e maturidade emocional.

De aprendiz a mestre

Nos anos 2000, Welch encontrou um novo espaço criativo ao integrar a banda Sugar Ray & the Bluetones. Foram mais de quinze anos de estrada, discos e amadurecimento ao lado do lendário vocalista e gaitista Sugar Ray Norcia. Nessa época, o “garoto prodígio” se transformou em um guitarrista de alma adulta — preciso, expressivo e consciente de sua herança musical.

Mas foi em 2016, ao lado do cantor Mike Ledbetter, que Welch viveu um de seus momentos mais intensos. O encontro entre os dois resultou no projeto Welch Ledbetter Connection e no álbum Right Place, Right Time (2017), uma homenagem direta à sonoridade de Otis Rush e ao blues de Chicago. O disco arrebatou o prêmio de Traditional Blues Album of the Year no Blues Music Awards e consolidou a dupla como uma das forças mais emocionantes do gênero naquele período. Infelizmente, a parceria foi interrompida pela morte prematura de Ledbetter em 2019 — uma perda que marcou profundamente o guitarrista.

O blues como cura

Nos anos seguintes, Monster Mike Welch enfrentou o silêncio e a dor, mas também o renascimento. Após lutar contra a COVID-19 e recuperar-se de complicações sérias de saúde, ele voltou aos palcos com uma nova perspectiva sobre a vida. Desse processo nasceu “Keep Livin' Til I Die”, lançado pela Gulf Coast Records, um disco que carrega em seu título a própria filosofia de Welch: viver enquanto há vida, cantar enquanto houver blues.

No álbum, o guitarrista entrega uma performance visceral, equilibrando a energia elétrica de Chicago com nuances de soul e gospel. Há faixas que soam como confissões — uma mistura de redenção e sobrevivência. Sua guitarra fala com a voz de quem aprendeu que o blues é, antes de tudo, sobre continuar: sobre se erguer depois das perdas, sobre manter o coração pulsando mesmo quando a música parece cessar.

O trabalho mostra um Welch mais maduro, menos preocupado com o brilho técnico e mais comprometido com a emoção pura. Em canções que transitam entre o tradicional e o contemporâneo, ele revisita suas influências — B.B. King, Otis Rush, Earl Hooker — e as reinterpreta com o olhar de quem carrega cicatrizes, mas também gratidão.

Legado e reconhecimento

Com uma carreira que ultrapassa três décadas, Monster Mike Welch é hoje um dos nomes mais respeitados do blues moderno. Já foi premiado como Melhor Guitarrista no Blues Music Awards, recebeu indicações constantes por seu trabalho autoral e é reverenciado tanto por veteranos quanto pelas novas gerações. Sua música une técnica e emoção em doses iguais, lembrando ao ouvinte que o blues não se limita a uma fórmula — ele é uma experiência humana completa.

Em sua trajetória, Welch deixou de ser o “monstro” prodígio para se tornar um contador de histórias. Cada solo é um capítulo; cada nota, uma lembrança. O menino de Boston cresceu, mas a chama do blues segue acesa em cada bend, em cada respiro de guitarra que ele oferece ao mundo.

Keep Livin' Til I Die — um testamento em forma de som

Mais do que um álbum, “Keep Livin' Til I Die” é um testamento emocional. É a resposta de Mike Welch às incertezas da vida, às ausências e às renúncias. Um disco que olha para o futuro sem esquecer o passado, onde o blues se torna oração e redenção. Em tempos de pressa e distração, ele nos convida a ouvir — não apenas o som das cordas, mas o eco do que permanece quando tudo parece ruir.

Monster Mike Welch é, enfim, a prova viva de que o blues nunca morre. Ele apenas muda de forma, de corpo, de guitarra — mas continua sendo a voz de quem insiste em 


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