Chuck Berry Blues: o pai do rock em sua mais pura alma blues
Chuck Berry Blues: o pai do rock em sua mais pura alma blues
Por trás da energia elétrica e dos riffs imortais que definiram o rock’n’roll, pulsava o coração de um bluesman. Em 18 de outubro de 1926, nascia em St. Louis, Missouri, um dos arquitetos da música moderna: Chuck Berry. E se os palcos do mundo o consagraram como o pai do rock, é no álbum Chuck Berry Blues que sua alma se revela em tonalidades mais profundas — onde cada nota carrega o eco ancestral das margens do Mississippi.
O blues dentro do rock
Quando pensamos em Chuck Berry, logo vêm à mente clássicos como “Roll Over Beethoven”, “Johnny B. Goode” e “Maybellene”. Mas antes do riff contagiante, antes do solo incendiário, havia o lamento. Berry era um filho direto do blues, e esse fio condutor se estende de suas composições mais famosas até as reinterpretações reunidas em Blues, coletânea lançada em 1983 pela lendária Chess Records.
Gravadas entre 1958 e 1964, essas canções mostram um artista que, mesmo quando se vestia de rock, nunca tirava o chapéu de bluesman. “House of Blue Lights” abre o disco com a energia boogie-woogie dos anos 40, antes de mergulhar em pérolas como “Driftin’ Blues” — herança dos clubes em que o jovem Chuck ouvia Johnny Moore’s Three Blazers — e “Down The Road Apiece”, um clássico do repertório de Amos Milburn que Berry reinventou com vigor elétrico.
Entre pianistas e velhos espíritos
Se Berry era a faísca, Johnnie Johnson era o combustível. O pianista, ex-fuzileiro naval e parceiro de estrada, está presente em 14 das 16 faixas, com seu toque elegante e vigoroso. Seu piano em “Wee Wee Hours” é um lembrete de que o blues também pode ser doce, melancólico e cheio de classe. Nas faixas restantes, Bob Scrivens e Lafayette Leake mantêm o fogo aceso.
É curioso pensar que a Chess tenha direcionado um compositor tão brilhante quanto Berry a gravar canções de outros autores. Mas o resultado é uma aula de respeito e reinvenção. Willie Dixon, por exemplo, surge em “I Just Want To Make Love To You”, numa versão adornada por vocais de apoio de The Ecuadors — um grupo de estúdio que incluía Etta James e Harvey Fuqua, do The Moonglows. Já “St. Louis Blues”, de W.C. Handy, soa quase como um retorno à casa.
A guitarra que falava em blues
Um dos momentos mais inspirados de toda a coletânea é “Deep Feeling”, instrumental em que Berry prova que não precisava de palavras para contar histórias. Inspirado em “Floyd’s Guitar Blues” (1939), de Andy Kirk & His Clouds of Joy, ele recria a melodia com um slide guitar de pura poesia metálica. O resultado encantou músicos como Mike Bloomfield, que elogiou seus “licks aracnídeos”, delicados e precisos como teias sonoras.
Com Berry, o blues deixava de ser apenas um gênero: tornava-se um território em que ele conversava com seus heróis e parceiros. Willie Dixon (baixo em 11 faixas), Hubert Sumlin (guitarra) e Fred Below (bateria) completam o elenco de luxo, formando uma base sólida que deixaria qualquer jam do Chess Studios incendiada.
O blues de um contador de histórias
Entre reinterpretações e composições próprias, Berry deixa claro que sabia o que fazia. “Sweet Sixteen”, escrita por Ahmet Ertegun, ganha nova vida em sua voz — a mesma que transformou histórias de adolescentes, carros e estradas em mitologia americana. E se o rock era seu veículo para alcançar o mundo, o blues era o motor que o movia. Como o próprio disse certa vez: “O blues é tocar para a vizinhança. O rock’n’roll é mirar na população inteira.”
Em “Still Got The Blues”, Chuck mostra que o gênero estava longe de ser apenas uma lembrança. Era sua base, seu refúgio. E quando ele pega a estrada na icônica “Route 66”, escrita por Bobby Troup, é como se o carro do rock’n’roll deslizasse sobre um asfalto pavimentado pelo blues. Não à toa, essa versão se tornou uma das favoritas de Mick Jagger.
O homem que ligou o blues à eternidade
Celebrar o nascimento de Chuck Berry é lembrar que o rock nasceu das mesmas raízes que nutriram o blues — e ele foi o jardineiro que fez esse som florescer. “Chuck Berry Blues” é mais que uma coletânea: é um espelho retrovisor onde podemos ver o reflexo de um artista que, mesmo correndo na frente, nunca esqueceu de onde veio.
Hoje, o mundo celebra o nascimento do homem que ensinou a juventude a dançar, mas o blues celebra o menino de St. Louis que aprendeu a sentir.
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