Silas Hogan: O swamp blues e os porões de Baton Rouge

Silas Hogan:  O swamp blues e os porões de Baton Rouge



Nas margens do pântano: o homem e a cidade

Nascido em 15 de setembro de 1911, em Westover, no condado de West Baton Rouge, Silas Hogan cresceu entre lavouras, porões e por vezes na proximidade dos pântanos que desenham a geografia sonora da Louisiana. Foi ali — na porosidade entre o campo e a pequena cidade, entre o trabalho manual e a música que nasce à noite — que se formou o seu timbre: uma guitarra simples, um fraseado lento e um cantar que parecia vir de um lugar onde o ar cheira a gasolina de caminhão e a orvalho. 

Um começo tardio para as gravações, mas raízes antigas

Hogan aprendeu a tocar ainda jovem, numa tradição oral transmitida por família e vizinhos. Apesar de tocar por décadas nos bailes e nas casas noturnas da região, só entrou em estúdio já na maturidade — por volta dos cinquenta anos — quando o produtor J. D. "Jay" Miller o levou a registrar músicas para o selo Excello. Foram singles e sessões que, mesmo em um período de desinteresse comercial pelo swamp blues, deram a Hogan um lugar discreto mas firme na história da música da Louisiana. 

O estilo: lento, raso e cheio de sombras

O swamp blues de Hogan é o blues da lama e da lixeira, do aeroporto próximo e dos bares de beira de estrada. Suas linhas lembram Jimmy Reed e o fraseado de músicos do circuito de Baton Rouge: guitarras elétricas sem pressa, harmônicas que fungam no fundo e um compasso que respira. Canções como "Airport Blues" e "Lonesome La La" são pequenas paisagens sonoras onde a solidão vira arquitetura — simples, direta, resistente. 

Os Rhythm Ramblers e a cena local

À frente dos Rhythm Ramblers — um grupo que o acompanhou nos anos dourados regionais — Hogan moldou repertório e repertórios moldaram-no: era comum ver o grupo tocar em salões, festas e clubes, alimentando a cena local e formando uma identidade sonora de Baton Rouge, entre o country-blues e as influências que vinha de Nova Orleans e do Delta. A presença de nomes como Moses "Whispering" Smith em algumas sessões ajudou a construir arranjos que não perdem a crueza e, ao mesmo tempo, ganham textura. 



Discografia essencial

Embora sua discografia seja modesta quando comparada a astros do blues, tem registros importantes que permitem mapear seu percurso:

  • Singles para Excello (início dos anos 1960) — onde surgem seus primeiros registros oficiais.
  • Álbum “Trouble at Home” (Blue Horizon, início dos anos 1970) — uma coleção que expõe o balanço entre o rural e o urbano no seu som.
  • Reedições e compilações posteriores que recolocaram algumas faixas em circulação e ajudaram a preservar sua voz para novos públicos. 

Trabalhador do dia, bluesman da noite

Como muitos músicos da sua geração, Hogan conciliou a música com ofícios e rotinas duras. Tocou para sobreviver e para transmitir memórias; guardou na voz os ritmos do cotidiano e o peso dos dias. Essa dupla vida — de quem ganha a vida longe dos palcos e encontra na música um lugar de verdade — está impressa nas suas gravações: há uma honestidade que não admite artifícios. O blues de Hogan não busca ser virtuoso — busca ser verdadeiro. 

Legado e reconhecimento

Hogan permaneceu uma figura discreta até o fim da vida, mas sua importância para o swamp blues e para a tradição de Baton Rouge é real: suas canções documentam um estilo, uma geografia e uma comunidade sonora. Morreu em 9 de janeiro de 1994, deixando um catálogo que voltou a ganhar atenção em reedições e compilações — pequenos lembretes de que, no mapa dos blues americanos, há estradas secundárias tão ricas quanto as rotas principais. 

Curiosidades

  • Aprendizado caseiro: Hogan aprendeu a tocar com membros da própria família e com músicos locais, preservando técnicas de afinação e estilo que vinham da tradição regional. 
  • Aeroporto e canções: O ambiente de Scotlandville e a proximidade do aeroporto local inspiraram algumas referências em seu repertório — daí títulos como “Airport Blues”. 
  • Redescoberta: embora tenha gravado tardiamente, suas músicas foram reaparecendo em compilações que ajudam a contar a história do swamp blues para audiências posteriores. 

Por que ouvir Silas Hogan hoje?

Porque ouvir Silas Hogan é escutar a Louisiana sem filtros: é permitir que a lentidão conte histórias, que a guitarra banho a sala com sal e poeira, que a voz de um homem que viveu o trabalho e a noite descreva—sem drama—o que havia à volta. Suas músicas nos lembram que o blues também é geografia: rios, pântanos, aeroportos, cozinhas e salões.

Em seu aniversário — 15 de setembro — celebramos não só o homem nascido em Westover, mas a paisagem sonora que ajudou a preservar.


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