Jimmy Reed – O mestre do blues que ensinou o mundo a dançar
Jimmy Reed – O mestre do blues que ensinou o mundo a dançar
Há artistas que carregam o blues como quem leva um segredo no bolso, e há aqueles que o transformam em língua franca, capaz de atravessar ruas, bares e fronteiras. Jimmy Reed pertence a esta segunda espécie. Sua música simples, direta e irresistivelmente dançante não só conquistou Chicago, mas também ecoou na Inglaterra, seduziu os Rolling Stones e inspirou músicos de todos os cantos. E o mais curioso é que tudo isso foi feito sem pressa — com um sorriso preguiçoso na voz e uma gaita que soava como conversa de varanda ao fim da tarde.
Do Mississippi para Chicago
Nascido Mathis James Reed em 6 de setembro de 1925, na pequena Dunleith, Mississippi, ele aprendeu cedo os segredos do violão e da gaita, sempre ao lado do amigo e futuro parceiro musical Eddie Taylor. O blues, ainda cru e rural, corria solto na sua infância — e já trazia aquela batida cadenciada que se tornaria sua marca. Serviu na Marinha durante a Segunda Guerra Mundial e, ao voltar, buscou em Chicago não apenas trabalho, mas também um palco para seu som.
Foi na cidade que Reed encontrou o caminho para a Vee-Jay Records, gravadora que lhe daria o primeiro sucesso: You Don’t Have to Go (1955). Daí em diante, vieram uma sequência de hits que subiram tanto nas paradas de R&B quanto nas pop, algo raro para um músico de blues nos anos 50. Seu som, simples e repetitivo, era feito para ser cantado e dançado, com letras curtas, refrões fáceis e um balanço que não deixava ninguém parado.
O estilo que conquistou todos
Jimmy Reed não tinha pressa para mostrar virtuosismo. Sua gaita parecia flutuar sobre um ritmo constante, quase hipnótico, enquanto a guitarra sustentava acordes firmes e repetitivos. A voz arrastada, muitas vezes ligeiramente fora do compasso, conferia um charme único, quase um improviso eterno. É por isso que músicas como Honest I Do, Baby What You Want Me to Do, Big Boss Man e Bright Lights, Big City se tornaram hinos universais do blues elétrico.
Reed foi um dos primeiros a fazer o blues atravessar as barreiras raciais na América. Sua música não falava apenas ao coração da comunidade negra — ela conquistou também as rádios e os ouvintes brancos, preparando o terreno para a explosão do rock nos anos 60.
Entre o sucesso e as batalhas pessoais
Por trás da voz calma e dos refrões bem-humorados, Jimmy Reed travava lutas silenciosas. Problemas com alcoolismo e crises de epilepsia afetaram sua carreira e, muitas vezes, o deixaram incapaz de se apresentar. Eddie Taylor, fiel companheiro, era quem sustentava as apresentações, muitas vezes assumindo as partes de guitarra e ajudando Reed a manter o tempo.
Apesar dos desafios, Reed permaneceu produtivo, lançando discos e se mantendo nas paradas por mais de uma década. Sua influência atravessou oceanos, e bandas como The Rolling Stones e The Animals regravaram suas músicas. Bob Dylan, décadas depois, prestaria homenagem direta na canção Goodbye Jimmy Reed.
A coletânea do Spotify e o “Big Boss Man”
No universo das plataformas digitais, é fácil se confundir com títulos repetidos. No Spotify, por exemplo encontrei uma coletânea com o título Big Boss Man, datada de 1963 e contendo 18 faixas. É uma seleção preciosa, reunindo clássicos como You Got Me Dizzy, Found Love, Baby What You Want Me to Do, Bright Lights, Big City e a própria Big Boss Man. Mas é importante dizer: essa não é a gravação original do álbum de estúdio homônimo de 1968, lançado pelo selo BluesWay com apenas 11 faixas inéditas.
Esta edição do Spotify é uma janela panorâmica para o melhor de Jimmy Reed — uma espécie de porta de entrada para quem quer conhecer sua obra sem seguir a ordem cronológica dos lançamentos. É também um exemplo de como o mercado atual reembala a história, misturando tempos e contextos para criar um “Jimmy Reed essencial”.
O legado
Jimmy Reed faleceu em 29 de agosto de 1976, em Oakland, Califórnia, aos 50 anos. Foi introduzido no Blues Hall of Fame em 1980 e no Rock and Roll Hall of Fame em 1991. Sua música permanece viva, tocando em rádios, bares, playlists e corações ao redor do mundo.
O que torna Reed eterno não é a complexidade técnica, mas a honestidade. Ele fez do blues algo universal, mostrando que a força da música está no sentimento — e não apenas na velocidade dos dedos. Ao ouvir qualquer uma de suas faixas, é impossível não sentir aquela batida mansa, quase como se ele estivesse ali, na sua frente, sorrindo por trás da gaita e dizendo: “relaxa, o blues também é alegria”.
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