Floyd McDaniel: o blues elegante que resistiu ao tempo
Um mestre discreto da guitarra e do swing
Na vasta galeria de mestres do blues de Chicago, poucos nomes trazem consigo a aura discreta e refinada de
Floyd McDaniel. Nascido em
21 de julho de 1915, em Athens, Alabama, e falecido em
22 de julho de 1995, em Chicago, McDaniel foi um daqueles artistas cuja trajetória escapa aos holofotes, mas permanece profundamente enraizada no solo fértil da história do
rhythm and blues norte-americano. Com um estilo que unia a elegância do
jazz ao calor do
blues, sua obra atravessou seis décadas, revelando um talento moldado por
T-Bone Walker,
Nat King Cole,
Charlie Christian e o pulsar vibrante dos anos 40 e 50.
As primeiras notas: dos Rascals ao Apollo Theater
Ainda adolescente, McDaniel migrou para
Chicago, onde começou sua carreira tocando guitarra em pequenos conjuntos. Um dos primeiros grupos em que atuou foi o
Rhythm Rascals, que chegou a se apresentar na
Exposição Mundial de Chicago, em 1933. Com eles, McDaniel ganhou projeção e foi convidado a integrar a banda do lendário
Cotton Club, o que o colocou em contato direto com os ritmos sofisticados do jazz e os grandes nomes da música negra norte-americana.
O sucesso com os Blazes
Na década de 1940, McDaniel se juntou ao grupo vocal e instrumental
The Four Blazes, mais tarde renomeado
Five Blazes. Misturando elementos de
blues,
doo-wop e
R&B, o conjunto gravou diversos sucessos, incluindo
Mary Jo, que alcançou o topo das paradas de R&B em
1952. A guitarra fluida e swingada de Floyd se destacava nos arranjos cheios de balanço, tornando-o uma peça-chave na sonoridade do grupo.
Silêncios e retornos: os anos longe dos palcos
Com o fim dos Blazes no fim dos anos 50, Floyd comprou um bar em Chicago e se afastou temporariamente da música. O silêncio durou anos, até que na década de 1970 ele passou a se apresentar com uma versão dos
Ink Spots, retornando aos palcos e mantendo viva sua verve musical. Já nos anos 80, juntou-se ao
Big Three Trio de
Willie Dixon, numa fase de resgate do
blues clássico e das raízes da música negra.

O sopro final: "Let Your Hair Down!"
Em
1994, aos
79 anos, McDaniel lançou seu primeiro álbum solo:
"Let Your Hair Down!", gravado com a banda
Blues Swingers e lançado pela gravadora
Delmark. A obra é uma joia rara do
blues tardio, onde o veterano desfila classe e energia em
17 faixas que misturam clássicos como
St. Louis Blues,
God Bless the Child e
Caldonia, com composições próprias e interpretações envolventes.
A crítica especializada aclamou o álbum. A gravadora Bear Family destacou a performance elegante de McDaniel e o repertório generoso, onde se alternam
swing,
R&B e
baladas emotivas. O disco foi visto como uma celebração à altura de uma carreira longeva e resiliente. Em faixas como
Let Your Hair Down,
Mary Jo e
Why’s Life Got to Be This Way, sua guitarra
Gibson Super 400 brilha com maturidade e segurança, como se cada nota fosse medida com sabedoria e experiência.
Últimos acordes
Em
julho de 1995, poucos dias após se apresentar no
Bremen Blues Festival, na Alemanha, McDaniel celebrou seu
aniversário de 80 anos. No dia seguinte,
22 de julho, sofreu um ataque cardíaco fatal enquanto dirigia por Chicago. Morreu como viveu: ativo, elegante, ainda em movimento.
Um legado de sobriedade e beleza
Floyd McDaniel é lembrado não por escândalos ou por grandes campanhas publicitárias, mas pela
consistência de sua música e pela
nobreza de seu estilo. Seu blues é
sofisticado sem perder a alma, é
dançante sem ser vulgar, é
nostálgico sem deixar de ser atual. No dia em que recordamos sua partida, revisitamos também o som de um tempo em que o
blues era sinônimo de
classe,
ternura e
swing.
Discografia recomendada
- Let Your Hair Down! (Delmark Records, 1994)
- West Side Baby (Delmark, 1997 - ao vivo, póstumo)
- Compilações com The Five Blazes (1940s-50s)
Frase final
Em cada solo de Floyd McDaniel há um
sorriso. Em cada frase, uma lembrança do tempo em que o
blues ainda usava
paletó e
sapato de verniz.
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