Albert Castiglia: alma, guitarra e verdade em "Righteous Souls"
Albert Castiglia: alma, guitarra e verdade em "Righteous Souls"
Por Todo Dia Um Blues
Do Bronx ao blues elétrico: as origens de Albert Castiglia
Nascido em 12 de agosto de 1969, em Nova York, Albert Castiglia é filho de pai italiano e mãe cubana. Ainda pequeno, mudou-se com a família para Miami, onde cresceu em meio a uma rica mistura de culturas e sonoridades. Aos 12 anos, teve seu primeiro contato com a guitarra, e dali em diante, o blues passou a ser a linguagem que o conectaria com o mundo.
Sua juventude foi marcada por uma intensa imersão na cena musical do sul da Flórida. Inspirado por mestres como Buddy Guy, Freddie King, Albert Collins e Junior Wells, Castiglia desenvolveu uma técnica afiada e um fraseado cheio de alma. Ainda nos anos 1990, começou a ganhar destaque tocando com a Miami Blues Authority, e logo chamou a atenção da crítica e de músicos veteranos.
Com Junior Wells: o batismo de fogo
Em 1997, Albert teve uma virada em sua carreira ao ser convidado por ninguém menos que Junior Wells para integrar sua banda. Foi um batismo de fogo: Castiglia assumiu a guitarra principal de um dos maiores nomes da história do blues de Chicago. Ao lado de Wells, rodou os Estados Unidos e a Europa, aprendendo diretamente com um mestre da velha guarda.
Após a morte de Junior Wells em 1998, Castiglia seguiu em frente carregando o legado de seu mentor. A experiência ao lado de Wells foi mais do que um marco profissional — foi um divisor de águas artístico e pessoal. A partir dali, sua música ganharia um peso emocional ainda maior.
A construção de uma discografia sólida
O primeiro álbum solo de Albert Castiglia veio em 2002. Intitulado "Burn", o disco já deixava clara sua pegada agressiva, com solos cortantes e letras que mesclavam amargura e redenção. Em seguida, vieram "The Bittersweet Sessions" (2003) e "A Stone’s Throw" (2006), que ampliaram seu público e consolidaram seu nome entre os novos mestres do blues moderno.
Discos como "Keepin’ On" (2010), "Living the Dream" (2012) e "Solid Ground" (2014) mostraram sua evolução como compositor. A parceria com a gravadora Ruf Records ajudou a impulsionar sua carreira internacionalmente. Castiglia era mais do que um guitarrista virtuoso: ele se revelava um contador de histórias sinceras, com forte presença de palco e autenticidade.
"Masterpiece" e "I Got Love": os álbuns do coração
Em 2019, Castiglia lançou o disco mais pessoal de sua carreira: "Masterpiece". O álbum foi inspirado por um reencontro inesperado com uma filha que ele desconhecia, e que lhe revelou que ele também era avô. A experiência foi profundamente transformadora. "Masterpiece" é um tributo à família, ao arrependimento e à esperança. Musicalmente, é direto e intenso, como um blues confessionário.
Em 2022, veio "I Got Love", álbum que reafirmou sua posição no topo da cena do blues contemporâneo. Castiglia mostra-se combativo e apaixonado, com letras sobre justiça social, amor, perdas e perseverança. O disco lhe rendeu dois prêmios importantes: Artista de Blues Rock do Ano e Álbum de Blues Rock do Ano.
“Righteous Souls”: o álbum do agora
Lançado em julho de 2024, o álbum "Righteous Souls" é uma celebração do blues em sua forma mais colaborativa. Albert Castiglia reuniu amigos e parceiros de estrada para gravar um disco com alma coletiva, marcado por duetos, homenagens e interpretações arrebatadoras. A produção ficou a cargo de Kid Andersen, conhecido por seu trabalho refinado e fiel às raízes do gênero.
O disco abre com "Centerline", um blues rock vigoroso com a participação de Popa Chubby. É uma música sobre buscar equilíbrio em tempos de instabilidade. Em seguida, vem "Get Down to the Nitty Gritty", uma releitura de Luther Johnson com vocais poderosos de Alabama Mike.
A terceira faixa, "Mama, I Love You", traz o cantor Kevin Burt e fala sobre afeto, legado e redenção. Já a versão de "You Can’t Judge a Book by the Cover" emociona pela presença de Christone “Kingfish” Ingram e da filha de Albert, Rayne Castiglia.
Um dos momentos mais tocantes é a interpretação de "All Our Past Times", de Rick Danko e Eric Clapton, com vocais de Danielle Nicole e um solo exuberante de Joe Bonamassa. A música resgata uma melodia clássica e transforma em confissão à três vozes.
Outras faixas marcantes incluem "Till They Take It Away", com Ally Venable incendiando os riffs, e "Come On In This House", com Rick Estrin nos vocais e gaita, revivendo a tradição de Junior Wells. Josh Smith brilha em "The Dollar Done Fell", um blues de protesto, e Gary Hoey emociona em "No Tears Left to Cry".
Fechando o álbum, "What My Momma Told Me" reúne Rick Estrin e Monster Mike Welch numa aula de tradição e criatividade. O disco é coeso, diverso e potente — um dos grandes lançamentos de blues de 2024.
O poder da coletividade
"Righteous Souls" é mais do que um álbum: é uma declaração de princípios. Castiglia optou por dividir os holofotes, convidando artistas que admira para somar vozes e timbres ao seu universo musical. O resultado é uma obra madura, emocional e musicalmente rica.
A presença de sua filha, Rayne, simboliza o elo entre passado e futuro. O disco também marca o reencontro com músicos que cruzaram sua trajetória, como Rick Estrin, Kid Andersen e Danielle Nicole. Essa abordagem afetiva dá ao projeto um sentido de comunhão raro na música contemporânea.
Discografia resumida
- Burn (2002)
- The Bittersweet Sessions (2003)
- A Stone's Throw (2006)
- These Are the Days (2008)
- Keepin’ On (2010)
- Living the Dream (2012)
- Solid Ground (2014)
- Big Dog (2016)
- Up All Night (2017)
- Masterpiece (2019)
- Wild and Free (2020)
- I Got Love (2022)
- Righteous Souls (2024)
Um artista com a guitarra na alma
Albert Castiglia construiu uma carreira honesta, consistente e emocional. Sua guitarra carrega a fúria do blues elétrico de Chicago, mas também a ternura das canções sulistas e o balanço do soul. Ele é, ao mesmo tempo, técnico e visceral — um artista que toca com o coração exposto.
Com "Righteous Souls", chega a um novo patamar. O álbum simboliza o que há de mais nobre no blues contemporâneo: tradição, inovação, entrega emocional e espírito coletivo. Castiglia não é apenas um dos grandes nomes da atualidade — é um dos responsáveis por manter viva a chama do blues no século XXI.
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