Robert Johnson: Muito Além da Encruzilhada
Robert Johnson: Muito Além da Encruzilhada
Poucos nomes na história do blues carregam tanto mistério, influência e fascínio quanto Robert Johnson. Com apenas 29 músicas gravadas entre 1936 e 1937, Johnson escreveu seu nome como uma lenda incontornável, não apenas no blues, mas em toda a música popular do século XX. Neste artigo, mergulhamos em sua vida breve e intensa, sua morte cercada de enigmas, a lenda do pacto com o diabo, as músicas que moldaram gerações, e o impacto que sua obra teve no blues e no rock. Também trazemos dicas de livros, filmes e registros fundamentais que perpetuam seu legado.
A Vida de Robert Johnson: Gênio Solitário do Delta
Robert Leroy Johnson nasceu em 8 de maio de 1911, em Hazlehurst, Mississippi. Criado entre diferentes famílias e sobrenomes, teve uma juventude marcada pela pobreza e instabilidade. Desde cedo, mostrou afinidade com a música e buscou aperfeiçoar sua técnica no violão — a ponto de, segundo relatos da época, desaparecer por um período e retornar com uma habilidade impressionante, como se tivesse feito um pacto com o sobrenatural.
Ele era um andarilho do blues, um artista das estradas poeirentas do Delta do Mississippi, tocando em bares, prostíbulos e esquinas. Suas letras carregavam melancolia, desejo, perda e espiritualidade, sempre costuradas por sua guitarra fluida e um vocal inquietante.
A Morte de Robert Johnson: Enigma e Tragédia
Robert Johnson morreu em 16 de agosto de 1938, aos 27 anos. Sua morte permanece envolta em mistério. A teoria mais aceita é a de que ele foi envenenado após se envolver com a mulher de um homem ciumento — talvez através de uma garrafa de uísque adulterada. Outros relatos sugerem que Johnson sofria de problemas de saúde pré-existentes, como úlceras ou varizes esofágicas, o que teria contribuído para sua morte súbita.
Não há certidão de óbito detalhada, nem sepultura confirmada com precisão — o que só intensificou os mitos ao seu redor.
O Pacto com o Diabo: A Lenda que Cruzou Gerações
A lenda mais famosa sobre Robert Johnson diz que ele teria feito um pacto com o diabo em uma encruzilhada, oferecendo sua alma em troca de se tornar o maior guitarrista do mundo. Essa história surgiu após seu retorno surpreendente com uma técnica extraordinária, aliada a canções que evocavam temas demoníacos, como “Me and the Devil Blues” e “Cross Road Blues”.
A encruzilhada se tornou um símbolo do blues e do dilema humano — a escolha entre o bem e o mal, entre o talento e o preço da fama. Real ou não, o pacto virou parte inseparável do mito de Johnson.
As Canções Mais Importantes de Robert Johnson
Mesmo com uma discografia enxuta, Johnson deixou canções que se tornaram pedras fundamentais do blues e foram regravadas por lendas do rock:
“Cross Road Blues”: O hino da lenda do pacto, fala de um homem perdido na encruzilhada, buscando redenção.
“Sweet Home Chicago”: Um convite romântico e urbano, transformado em hino por gerações de bluesmen.
“Hellhound on My Trail”: Um retrato visceral da perseguição espiritual e emocional.
“Love in Vain”: Lamento melancólico sobre o amor não correspondido, regravado pelos Rolling Stones.
“Me and the Devil Blues”: Confronto direto com o sobrenatural, onde o narrador caminha lado a lado com o diabo.
O Impacto no Blues e no Rock and Roll
A influência de Robert Johnson no blues é inquestionável — ele sintetizou o blues do Delta e criou uma linguagem emocional profunda, que influenciou nomes como Muddy Waters, Howlin’ Wolf e Elmore James.
Nos anos 60, com a redescoberta do blues pelos britânicos, Johnson virou referência para Eric Clapton, Keith Richards, Jimmy Page e Bob Dylan. Seu estilo de tocar, com linhas de baixo, acordes e melodia simultâneas, moldou a técnica do violão moderno.
Eric Clapton chegou a declarar que Robert Johnson foi “o maior cantor de blues que já viveu”.
O Livro A Música do Diabo
O livro A Música do Diabo, escrito por Bruce Conforth e Gayle Dean Wardlow, é um trabalho sério e revelador. Com base em décadas de pesquisa, os autores desconstroem mitos e trazem à tona um Robert Johnson humano, complexo, falho e genial.
O livro mergulha em sua trajetória desde a infância até sua morte, revelando dados inéditos, testemunhos e análises musicais. Para quem deseja compreender o homem por trás da lenda, essa obra é essencial.
O Diabo na Encruzilhada: A Lenda em Documentário
O documentário O Diabo na Encruzilhada, lançado em 2019, é uma peça audiovisual envolvente que mistura entrevistas, animações e recriações estilizadas da vida de Johnson. É uma narrativa moderna que, apesar de compacta, consegue capturar o mistério e o poder simbólico de sua obra. Vale cada minuto para os apaixonados por blues e lendas.
A Encruzilhada (1986): O Filme que Me Levou para o Blues
O filme A Encruzilhada foi um divisor de águas na minha vida. Estrelado por Ralph Macchio, Joe Seneca e Jami Gertz, o longa de 1986 conta a história de um jovem guitarrista clássico em busca de uma música perdida de Robert Johnson. A trilha sonora de Ry Cooder é simplesmente magistral, e o duelo final com Steve Vai é uma cena icônica que marcou gerações.
Esse filme me levou de vez para a estrada do blues nos anos 80. É entretenimento puro com alma musical.
Mais uma Pérola: The Search for Robert Johnson
Outro documentário que merece destaque é The Search for Robert Johnson, produzido no início dos anos 90. Nele, o bluesman John Hammond Jr. percorre os caminhos de Johnson, entrevista pessoas que o conheceram e tenta separar o homem do mito. É uma obra sensível e comovente, ideal para os que desejam enxergar Robert Johnson sob um olhar mais realista.
The Complete Recordings (1989)
Lançada em 1989, a coletânea dupla Robert Johnson: The Complete Recordings é uma relíquia. Reúne todas as gravações conhecidas do músico, incluindo takes alternativos. Mais que um simples álbum, é um documento histórico, que já vendeu centenas de milhares de cópias ao redor do mundo.
Com qualidade remasterizada e encarte detalhado, essa compilação é essencial para quem quer sentir na pele a força bruta e lírica de Robert Johnson.
Conclusão
Robert Johnson é muito mais que um mito do blues — ele é um símbolo da alma musical americana, um poeta dos campos de algodão, um artista que transformou dor em arte atemporal. Entre a crueza de suas canções, o enigma de sua morte e a poderosa mitologia do pacto, ele permanece vivo para todos que, como eu, viajaram pelo Blues a partir de um filme, um livro ou uma simples canção. Que sua obra continue ecoando nas encruzilhadas de quem busca, no silvo das cordas, a verdade do Delta.
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